Opinião GP: Catar escancara terrível trabalho da FIA e liga sinal de alerta na Fórmula 1
Ainda que o GP do Catar vá ser lembrado pelo tricampeonato de Max Verstappen, há alguns elementos deste fim de semana que vão ganhar a memória rapidamente e não no bom sentido. Os inexplicáveis problemas do traçado catari causaram o temor de falhas sérias com os pneus, e isso forçou a FIA a mudar limites de pista e determinar stints para a corrida principal de última hora. A conduta, mais uma vez, expôs o péssimo trabalho da entidade que rege o esporte
O TRICAMPEONATO DE MAX VERSTAPPEN foi o ponto alto do fim de semana do GP do Catar, mas lamentavelmente a etapa em Lusail ficará marcada por mais um capítulo da completa inabilidade que toma conta da entidade que deveria reger o esporte e da própria Fórmula 1. A Federação Internacional de Automobilismo transformou a corrida catari em um show de horrores e flertou com o perigo. Porque simplesmente não é aceitável que a fornecedora de pneus descubra em plena sexta-feira, pós-classificação, que há falhas incomuns no traçado e que isso põe em risco a segurança dos pilotos. Indo além, a decisão final sobre o problema foi tomada apenas horas antes da corrida principal. Obviamente, a fabricante agiu corretamente ao alertar sobre o temor de danos, mas o caso todo precisa de uma urgente revisão.
Acontece que, logo depois da sessão que definiu o grid de largada da prova de domingo — ainda na sexta-feira, devido ao formato sprint —, a Pirelli conduziu sua avaliação rotineira dos compostos e encontrou problemas graves, que poderiam causar furos e incidentes sérios em stints longos. Naquele momento, constatou-se uma separação da superfície da camada lateral do pneu da carcaça, o que, segundo a fornecedora, "um número significativo de voltas adicionais com estes compostos poderia resultar em danos circunferenciais dos pneus, com subsequente perda de ar”.
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Ao tomar conhecimento dos problemas, a FIA decidiu inicialmente alterar os limites de pista nas curvas 12 e 13 em 80 cm, por conta do formato de pirâmide das zebras. A meta era fazer os pilotos usaram apenas a parte mais plana da área de apoio. Na visão da Pirelli, a passagem frequente dos carros por esses trechos, em alta velocidade, aliada à vibração, causava os danos. Então, como medida adicional, a entidade ainda promoveu um treino extra antes da classificação da sprint para que todos se adaptassem. Aqui, um detalhe importante e que foi levantado por nomes como Fernando Alonso, Carlos Sainz e Lewis Hamilton: nenhum piloto foi consultado sobre essas ações ou sobre o que poderia acontecer. A Ferrari, por meio de Frédéric Vasseur, teceu críticas ao que chamou de "gerencimento errado" da FIA. Quer dizer, outro ponto inexplicável desse tosco episódio.
Após a sprint, a Pirelli retomou as análises sobre o comportamento dos pneus e percebeu que os problemas continuaram. Os compostos usados na corrida curta também apresentaram os mesmos sinais de danos — mesmo com um ritmo de corrida menor por conta das intervenções ao longo da prova. E como as falhas estavam em ambos os lados dos compostos, ficou evidente que não era apenas uma questão de limites de pistas específicos, mas de todo o circuito, de acordo com informação da revista Auto Motor und Sport. Ou seja, a pista inteira era um problema. Diante disso, a FIA precisou estabelecer, por segurança, um limite para o uso de um único jogo de pneus: 18 voltas. E determinou um mínimo de três pit-stops. Tudo isso horas antes do apagar das luzes no Catar.
De novo, sem qualquer tempo para testar ou entender se as medidas funcionariam, a entidade apenas confiou na sorte, aparentemente. O que por si só já é uma aberração. Ainda assim, muitos pilotos violaram seguidamente os limites de pista ao longo da corrida — com punições a rodo, inclusive. No fim das contas, a ação parece ter controlado os problemas, o que não justifica o fato de que a FIA chegou ao Catar sem conhecer de fato todos os aspectos do circuito, e isso abre um precedente dos mais perigosos.
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É inadmissível que a entidade não tenha antecipado os problemas com uma rigorosa vistoria, uma minuciosa simulação, ainda mais por se tratar de um autódromo recém-recapeado e reformado. E há outro ponto deste fim de semana que não pode passar batido: o calor excessivo. Praticamente todos os pilotos enfrentaram algum tipo de mal-estar e desconforto. Alguns de maneira severa, como Logan Sargeant, que sequer foi capaz de completar a prova. Esteban Ocon vomitou durante a corrida mais de uma vez, Alonso sofreu queimaduras, Lance Stroll relatou um ‘apagão’. Até o top-3 estava acabado na salinha antes do pódio.
Naturalmente, é uma forte característica daquela região, mas cabe também à FIA se certificar de que há condições de segurança como um todo, não dá para colocar na conta da imprevisibilidade do clima. O Catar tem mais dez anos de contrato pela frente e é visto como um palco valioso para o esporte, mas medidas vigorosas precisam ser tomadas já para a etapa de 2024. É imperativo, assim como uma autocrítica da própria entidade.
Porque neste momento é muito válido questionar: que tipo de mensagem o órgão transmite ao mundo e aos seus pares nesse cenário? Dá para confiar nas decisões da FIA e de seus comissários? Essas são perguntas, inclusive, que a Fórmula 1 deveria também se fazer.
E como está na moda, o que isso agrega à maior categoria do esporte a motor? É essa a imagem que deseja mostrar ao mundo? Tenho a impressão que não.
A Fórmula 1 volta daqui a duas semanas, entre os dias 20 e 22 de outubro, em Austin, com o GP dos Estados Unidos, o primeiro da última perna tripla da temporada. E o GRANDE PRÊMIO acompanha tudo.