McLaren e Alpine são rivais, claro, mas têm mais em comum do que possivelmente imaginam.
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Na temporada de 2021, a disputa da equipe de Woking foi com a Ferrari, e pelo terceiro lugar do Mundial de Construtores. Por consequência, a Alpine — em seu primeiro ano de dupla formada por Fernando Alonso e Esteban Ocon — ficou naturalmente atrás. Bem atrás: 155 a 275 pontos na tabela.
Para 2022, mudanças deram o tom. Não só na Fórmula 1, com seu novo regulamento técnico — a maior alteração das regras em 40 anos —, como também na própria equipe francesa. Otmar Szafnauer chegou, assim como Bruno Famin, por exemplo.
O cenário, pois, ficou diferente. A Alpine acertou a mão e trouxe ao mundo uma boa A522, bólido da temporada. A abordagem estratégica também chamou atenção: ao contrário dos demais times, a equipe azul constantemente atualizou seu carro, corrida a corrida. Nada de ‘pacotão’ repentino.
Nada disso significou, entretanto, que a Alpine não iria contar com um indesejado calcanhar de Aquiles: a confiabilidade.
Alonso cansou de dizer e ressaltar, em mais de uma oportunidade, o prejuízo na tabela pelas falhas do bólido francês em 2022. “Com certeza, não estou feliz. Um pouco decepcionado, mais uma vez. Já estava com 50 pontos a menos ao longo do ano por conta de problemas mecânicos — adicionamos mais 10 hoje, então 60. E se você colocar 60 pontos a mais para mim no Mundial de Pilotos, estaria em outra liga.”, disse o bicampeão, após o abandono em Singapura — o 4º da temporada. Foram 6, ao total: Arábia Saudita, Emília-Romanha, Itália, própria Marina Bay, México e Abu Dhabi.
Curiosamente, Ocon ‘só’ teve dois abandonos ao longo da temporada — em Silverstone e Singapura. Isso, eventualmente, gerou comentários irônicos do Príncipe das Astúrias. “Para o carro 14, sempre existem problemas de confiabilidade. Só é incrível que só um ou dois carros abandonem em todas as corridas e seja sempre o carro 14. Estouramos cinco motores este ano”, esbravejou Alonso, após o GP da Cidade do México.
A alfinetada de Alonso respingou na relação do espanhol com Ocon. A partir daí, um inesperado clima de rivalidade tomou conta da equipe francesa. O ápice disso aconteceu em Interlagos: na corrida sprint, Alonso e Ocon se estranharam logo no início, quando duelavam pela sexta posição. O toque entre eles quebrou a asa dianteira do carro do espanhol, que ironizou a manobra do francês ainda pelo rádio. “Ele me empurrou na curva 4 e depois na reta. Muito bem. Perdi minha asa dianteira. Um muito obrigado ao nosso amigo”, bradou.
Ocon esperou a temporada acabar para despejar suas respostas. “Não é segredo que fiquei decepcionado ao ver os comentários dele após a corrida. Não havia nenhuma necessidade para algumas críticas que ele fez. Mas eu o respeito muito. Sempre vou respeitá-lo pelo que ele fez na pista e ao longo dos anos. Ele é uma lenda do esporte, e isso não vai mudar, mas fiquei um pouco decepcionado”, pontuou.
Pouco depois, o francês deu declaração ainda mais contundente — acusando sobrecarga na temporada e apontando uma certa falta de envolvimento de Alonso com o trabalho diário na Alpine.
“Respeito tudo o que ele fez na pista, seus títulos e, principalmente, a motivação que tem com a idade atual. É bom que ele vá para a Aston Martin e que sigamos nossos próprios caminhos. 98% do trabalho caiu sobre mim e 2%, nas costas dele. Fiquei sobrecarregado. Fiz todo o desenvolvimento em simulador, o marketing…”, disparou.
Fato é: se a Alpine já trabalha para se livrar dos problemas de confiabilidade, projetando inclusive chegar ao nível das três equipes do topo do pelotão e revelando um desenvolvimento significativo do bólido para 2023, a equipe francesa — contra sua vontade, é verdade — vai se livrar de outra possível dor de cabeça na próxima temporada. Afinal de contas, Alonso está de malas prontas para a Aston Martin.
Existem dúvidas sobre a relação entre Ocon e Pierre Gasly, dupla de 2023? Existem, claro. Mas este segmento faz parte de um outro capítulo.
Vamos pular o muro e falar da equipe de Woking. A McLaren se parece com a Alpine, e não só pelo nível de performance, não. As duas assumiram o posto de melhores equipes ainda incapazes de pódio a cada corrida — Lando Norris foi o único piloto fora do ‘trio de ferro’ que conseguiu ao menos um top-3 no ano.
É que, assim como a Alpine, a McLaren teve um calcanhar de Aquiles crônico ao longo de 2022. Esse, com nome e sobrenome: Daniel Ricciardo.
Verdade seja dita: Norris brigou sozinho contra Ocon e Alonso. De 22 corridas na temporada, Ricciardo só pontuou em 7. Pouco, pouquíssimo, para um piloto como ele, em uma equipe como a McLaren.
Sem a ajuda do companheiro de equipe, Norris buscou forças de onde dava para deixar a disputa equilibrada. Conseguiu, em parte, mas não deu. O MCL36, segundo o próprio britânico, também não colaborou muito.
“O quinto lugar é onde merecíamos ficar. É natural que se fique decepcionado quando há uma chance de ficar em quarto e você sente que dava para ter conseguido, mas tivemos um fim de semana de confiabilidade ruim enquanto a Alpine teve quatro ou cinco [ao longo do ano]. Eles tiveram um carro mais rápido na maior parte do ano”, apontou Lando.
“Então, acho que conseguimos nos manter na briga por muito tempo, o que mostra como nosso trabalho foi bom com um pacote pior, na realidade. Assim, termino bem feliz. Ficamos em quinto, mas há muita coisa boa a tirar do trabalho que estamos fazendo. Começamos muito atrás na temporada. Espero que comecemos bem melhor no ano que vem, consigamos realizar o desenvolvimento, fazer o progresso que fizemos neste 2022 e, aí, vamos terminar bem melhores”, completou.
A tendência de crescimento da McLaren, com evoluções a cada temporada, foi interrompida em 2022. Na tabela do Mundial de Construtores, derrota para Alpine: 173 a 159. Para mudar o cenário em 2023 e retomar a trajetória ascendente, Zak Brown e Andreas Seidl — este último agora está na Sauber — demitiram Ricciardo.
O substituto veio da Academia de Pilotos da… Alpine, veja só. A rivalidade entre as duas equipes ultrapassou os limites de pista e foi para os tribunais. Oscar Piastri rejeitou publicamente o time francês e assinou com a McLaren. A polêmica toda, com certeza, você já sabe.
Em setembro passado, o CRB (Conselho de Reconhecimento de Contratos, em português) — órgão da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) que regula contratos —, validou o vínculo entre o australiano e a equipe de Woking.
Tanto a McLaren quanto a Alpine, pois, projetam vida nova em 2023. A esquadra de Woking deu adeus a Daniel Ricciardo, a equipe azul vai se despedir de um A522 veloz, mas com claros problemas de confiabilidade.
Será que Piastri vai dar conta do recado? E o próximo bólido da Alpine, não terá tantas falhas?
A expectativa é que as respostas para tais perguntas sejam afirmativas. Sem mais ‘âncoras’ de performance, afinal, e clima de tira-teima na próxima temporada. Quem leva?